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sábado, 22 de dezembro de 2012

kangosta vellha. fiquemos apenas sonhando

 
 




Fiquemos Apenas Sonhando
 
 
Quando viajo não sinto
Esta dor que me irrita,
Provocada pela ânsia
E pela vontade de mais fazer,
De ir mais além.
 
 Temos dentro de nós um padecer ancestral,
Uma névoa talvez que nos faz mal, pessimamente mal.
É um rumo,
Ou uma prisão alta e sem guarda
Que em noites mal dormidas,
Pesa-nos no corpo do sentir que embala a Noite.
 
 Fazemos tricot em chávenas douradas;
Chás das Índias Orientais, Persas,
Ou fumamos caídos em bálsamos suaves,
Desvendando os mistérios antigos...
 
 “ ...Estes cães de agora são subtis,
Comem durante a noite dos caixotes,
Das sacas do lixo o alimento
Que deixamos apodrecer nas veias
Das estradas e caminhos;
E são vários os cães,
Uma data deles assaltam-nos a alma
E quebram-nos as horas...”
 
 Ficamos de repente vazios...
 
 E todo o imenso mundo se nos abate,
Caindo com um estrondo trepidante “ – Pum ...“
Ouvimos as engrenagens das horas
Fazerem-nos lembrar a existência da realidade
Que é só nossa e só nossa deverá ser lembrada.
Adivinhamos o seu passo (relógio)
E vivemos o pássaro na gaiola lá ao fundo da sala.
 
  “- Trago uma constipação pesada.
Hoje passei todo o dia assim...
Não me digas que também estás?...”
 “- Trazemos dentro de nós a doença que nos irá ser fatal,
Não viste hoje aquela do tal Dr.?...[1]
“- Que coisa esquisita !...
Dizem até que morreu como o outro do futebol
Aqui à uns meses atrás”[2]
“- Há constipações que vêem e se vão embora
Rapidamente de uma hora para outra...”
“- Sim, mas existem outras...,
Sim eu compreendo,
Como esta que me não larga,
Pá estou a desesperar...
Tira-me o sono, causa-me insónias;
Mas tenho tido outros problemas,
E o maior de todos é ter que fazer
Uma alimentação saudável.”
“- Pois é compreensível pá estás a ficar obeso.”
“- Vou este Verão tentar viver mais despreocupado,
É imperial que assim o faça.
Estou numa fase de fazer separações,
Balancear, pesar, tirar notas,
Ou conclusões e me demarcar de tudo e de todos...
Esverdear a minha vida azulando-a.”
 “- Hei-a pá, grande trocadilho.
Onde foste buscar isso?...”
“- Sei lá... Por acaso.
Pensa-se e já está; penso que nem penso nisso.
Deve de ser a genialidade em hora de sono,
E da escrita automática, que nos faz ser assim.”
“- Agora só te falta te transformares em nuvem!...”
“- Em nuvem?... Estás doido ou quê?
Se há coisa que não gostava de ser era nuvem.
Eu gosto mais de calma, deixa isso para os Existencialistas,
Eu sou mais progressista e renovador
De extrema verdade quer de Direita ou de Esquerda;
Me assumo pelos Direitos do Homem”.
“- É bem verdade que aqui fazemos juz
Aos princípios da Igualdade, Fraternidade, Democracia
– um claro Manifesto de verdade anti...,
Anti-anti-arte,
Anti-anti-cultura e por ai fora, estás entendendo?...”
 
“- Perfeitamente... Fiquemos apenas sonhando...”.


[1] Dr. Sousa Franco, candidato ao Parlamento Europeu.
[2] Féher, jogador do Benfica.
 
                                                     do livro "pretéritos imperfeitos" 2006 josé luis pinto
 

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